08/09/17

Um olhar sobre o MAR DOS SENTIDOS (poesia)

José Luís Outono “MAR DOS SENTIDOS”
(chancela Edições VIEIRA DA SILVA, numa edição de 2012)
Opinião Literária©
(não escrevo segundo as regras do acordo ortográfico)


Da minha leitura, a análise sempre subjectiva, que fiz do livro de JOSÉ LUIS OUTONO, “Mar de Sentidos

José Luís Outono, existe, enquanto poeta, no espaço e no tempo. E existe a obra enquanto, sem invenções, nela “sonha” o poema, o faz “nascer”, o constrói, o eleva, através da palavra, ao interior da alma de quem o lê, pois, na sua, teve gestação antes de nascer. Afirma-se, o poeta, não apenas como corpo, que é, mas, também, como construtor de signos – construtor, e, não, inventor! – com que talha a sua escrita.

Descansa nas letras, que escreve, e nos versos que constrói. Tanto está “no olhar” de alguém “sem descansar”, como sulca o mar em desafios constantes da palavra. Exprime-se, no termo poético, através desses signos, tão seus, com mestria tal, que faz parar o leitor, no tempo, sem deixar o tempo do autor, para regressar ao princípio e se extasiar de novo na leitura.

Só, assim, quem lê José Luís Outono, o conseguirá ler e compreender sem perder o fio à leitura. Eu li-o, neste seu Mar de Sentidos, por quatro vezes, pausadas em tempo longo, mas o suficientemente curto para não me não perder na memória da leitura, e poder tecer, dele, este comentário, que não é crítica literária na verdadeira acepção da palavra, nem a tanto me atrevo. É nesses “rios de cristal” que Luís Outono se abraça à escrita, levando-nos consigo, para nela nos elevarmos nas suas “margens de porto seguro”. Nas “falésias sorriso” das suas palavras que manuseia com perícia ímpar, faz-nos “beber o néctar” sempre “no sentido nascente” do seu Mar de Sentidos.
 Luís Outono mostra com esta sua escrita, quase sui generis, que ele é mais do que o ser da linguagem. Ou, do que um ser na linguagem. É um ser que se auto supera, nunca se fixando nos limites do óbvio. Ele, mesmo em cantata ao vulgar amor, que não é tão vulgar quanto isso, o transforma em amor-maior, pois fá-lo em construção sábia e jamais se fica pelo simples, pelo fácil, pela obviedade. Assume-se, nas suas palavras, como eterno dever. “… as palavras emergem / na sensibilidade de um dar // … as palavras são o amar / da vida e do ser / mesmo nos silêncios agridoces / até no conjugar sem posfácio //. Não se nega, nem nega o amor que canta, num certo movimento, mais ou menos contínuo, com algumas interrupções e devaneios pela cidade de um Outono sempre em estado primaveril.

 Autor e texto em osmose perfeita, “fatal”, como diz o autor. Exprime-se com inquietação numa “quietação” de diálogo tal, que as “razões hercúleas” do seu sentir, o tornam único, singular, no seu Mar de Sentidos. A escrita poética de Luís Outono é uma faca de dois gumes, que escreve “azul com a cor do coração”. Porque o seu “tesouro” se encontra “no fundo do mar aberto de pleno imenso” onde as “algas (…) hospedam o borbulhar de uma lenda …”, mas se encontra, também, nesse mesmo “fundo secreto fascínio do mar toldado”, onde “há vida (…) e correntes cíclicas de atrevimentos… //”.
Dos seus poemas, faz um hino, onde prolonga o amor sentido, quando criança, nos braços do desejo de um dia só, por viver, mesmo que “sem nome e sem sorrir”. Nem mesmo os “tantos disparates” que escreveu, que nem a “memória os guarda”, deixam de ser a sua afirmação intemporal da vontade e temporal, ao mesmo tempo, porque os seus versos consistentes, ainda que na “ceia” da “tarde brilho do Outono”, eles “multiplicam-se de sabores” e ânsias de saber.

É dialógico, no campo do amor que canta. Ainda que mantenha o diálogo, em monólogo poético, define-se como alguém que se reconhece “cego de esperas”, de sorrisos que se esfumam de desafios aos quais já não pertence. Mas, não desespera. Pois, “se um dia construísse um apelo / faria um muro de palavras / (em) poema universal /”. Ao invés de classificar José Luís Outono, como poeta com rótulos de escolas, ou tendências, pois a tal me não atrevo por não ser crítico literário, em consciência o digo, plausível será reconhecê-lo como um dos melhores poetas, da língua portuguesa, da contemporaneidade.
           



© copyright 2012 Fernando A. Almeida Reis, ortónimo de Alvaro Giesta e de Miguel Faia, todos os direitos reservados para o Autor e Jornal Rostos. Não pode ser dado qualquer uso comercial ao texto, sem a devida permissão do autor.

A INTUIÇÃO E O INTELECTO

Intuição e Intelecto: dois opostos entre dois pontos, apenas à distância de um salto inalcansável


«(...) Sem olhar à profundidade dos seus sentimentos, à vastidão dos seus conhecimentos, o homem aparentemente completo não o é sem que tenha aperfeiçoado as suas tendências. Quem quiser melhorar os condicionalismos externos tem de começar por melhorar os internos. Quando as coisas não estão a correr bem há qualquer coisa em mim a dizer-mo. Às vezes tenho de pensar muito para descobrir o erro e como corrigi-lo. Depois de resolver o problema sinto-me novamente bem. Isto prova que «O seu instinto leva-o mais longe que o seu intelecto».
Alfred Montapert, in "A Suprema Filosofia do Homem"

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Intuir é negar à razão o direito a conhecer de imediato; seja, é conhecer directamente as coisas sem a necessidade de recorrer à razão para delas tomar conhecimento. E é por esse motivo que a razão nega também a intuição pela sua incapacidade de a encontrar. O intelecto não encontrando a intuição não a pode explicar, embora a possa sentir. E não a pode explicar porque, para explicá-la seria necessário buscar a sua causalidade - responder às perguntas: de onde ela vem, porque vem, como vem e qual a relação causa-efeito entre a intuição e a coisa conhecida.

Ora, porque a intuição não nasce do intelecto nem com o intelecto, não faz uso do recurso do raciocínio para explicar sobre o conhecimento das coisas, não precisa da razão para conhecer, porque ela é, em si mesma, um fenómeno não científico e irracional, um fenómeno não-fenómeno, podemos com firmeza dizer que a intuição não se explica. Se nascesse do intelecto ela poderia ser explicada, tinha que ser explicada porque ela seria, obrigatoriamente, racional pela razão que vinha do e com o raciocínio. Mas ela, a intuição, é um fenómeno irracional que jamais pode ser reduzido ao intelecto.

E aqui cabe reflectir sobre os dois domínios de existência - o (já) "conhecido" e o (por enquanto) "desconhecido" (sendo que este último é aquilo que o intelecto ainda busca) -, para podermos fazer uma destrinça entre aquilo que muito nos confunde: entre o FENÓMENO (não-fenómeno) INTUIÇÃO e o PODER DO INTELECTO. Ou seja, entre aquilo que é inacessível ao conhecimento e aquilo que a razão já conheceu ou vai conhecer; entre o "impossível de conhecer" e o  já "conhecido" que indagou o "onde", o "como" e o "porquê", ou o que, embora (ainda) "desconhecido", se vai conhecer usando o raciocínio. Portanto, um e outro fenómenos (estes dois últimos) são domínios da razão para deles conhecer.

Assim, a intuição não é um fenómeno "desconhecido",  porque este, sendo do domínio do intelecto, há de ser conhecido através da indagação, da pesquisa, da experimentação. A intuição é, sim, um fenómeno "incognoscível" - ou seja, inacessível ao conhecimento. A qualidade intrínseca do incognoscível é ser isso mesmo: INCOGNOSCÍVEL. É com o incognoscível, isto é, com aquilo que não pode ser conhecido pelo raciocínio, que a intuição labora, ao contrário da razão que trabalha com o conhecido e com aquilo que, embora sendo desconhecido pode vir a ser conhecido.
A intuição leva-nos mais longe que o intelecto - «conhece-te a ti mesmo», disse o filósofo. A intuição é a arma perfeita para,  em auto-análise seguida da acção, tornar o Homem em «escola da sabedoria».

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Jamais o intelecto poderá conhecer o que nunca pode ser por ele conhecido. Esse místico incognoscível chamado intuição vem de qualquer lugar desconhecido no vazio do ser, de qualquer lacuna do ser, que nunca do intelecto - embora o intelecto a possa sentir mas nunca explicá-la dado não ser um fenómeno científico mas, outrossim, um fenómeno puramente irracional.
A intuição não acontece; surge de qualquer lugar desconhecido do ser pois, se acontecesse, tinha necessariamente que ser explicada. Podia ser explicada. Mas, porque a intuição vem de um domínio diferente do acontecer, um domínio diferente de qualquer causa intelectual e racional que forçosamente interroga e procura as causas primeiras e últimas e as suas consequências com a finalidade de, aproximando-as do intelecto, as explicar e chegar à primeira causa que moveu o primeiro motor imóvel, ela é a realidade mais elevada do ser que, assim sendo-o, jamais pode ser penetrada pela causa mais baixa, neste caso o intelecto do próprio ser, que interroga para chegar à causa primeira. A intuição é essa causa primeira e irracional do ser, é esse fenómeno não científico e inexplicável pela razão por ser o poder mais elevado do ser.
É o fenómeno incognoscível que a razão não alcança, tão semelhante à mente que penetra no corpo impossibilitando, contudo, o seu contrário; assim a intuição pode penetrar no intelecto (poder mais baixo) e nunca este pode ascender à intuição porque esta é o poder mais elevado do ser.

Recorrendo ao raciocínio de Osho sobre o que diz ser a intuição «(...) nem sequer é um fenómeno; é unicamente um pulo no nada para o ser», se pode deduzir que a intuição é uma «lacuna» que apenas o intelecto sente mas que é impotente para a explicar; embora sentindo-a como lacuna, não a pode explicar porque não sabe, o intelecto, como nasce a intuição, onde nasce a intuição e porque nasce a intuição.
Ela é um fenómeno que, na voz de Osho, não chega a ser fenómeno. Àquilo a que a razão chega é apenas "sentir" que "aconteceu qualquer coisa" que a ultrapassou. E essa qualquer coisa é o tal fenómeno inexplicável, o tal fenómeno não científico e irracional, o tal não-fenómeno.

A razão nega, sempre, poder à intuição porque esta jamais pode ser explicada e o intelecto só aceita aquilo que pode ser explicado. Tudo o que está para além da razão e a ultrapassa é a realidade mais elevada do ser, o tal fenómeno que, não sendo fenómeno, não pode ser explicado numa relação de causa-efeito, e jamais aceita, o intelecto, que a intuição lhe fale. Ele, o intelecto, na sua procura das coisas, das causas e dos seus efeitos, jamais deixa que o instinto lhe dê pareceres. Mas, mesmo assim, ou talvez por isso mesmo, o intelecto estará sempre acorrentado à intuição; jamais a razão se separará da intuição como o corpo jamais se separará da mente.
A intuição, fenómeno não-fenómeno mais elevado do ser, como lacuna do pensamento, jamais pode ser reduzida ao intelecto.
E assim se justifica o título dado ao inquietante artigo: A INTUIÇÃO E O INTELECTO - dois opostos entre dois pontos, apenas à distância de um salto inalcançável.

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© Alvaro Giesta
da cónica semanal de Alvaro Giesta publicada na revista BIRD de 09/12/2015
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