Intuição e Intelecto: dois opostos entre dois pontos, apenas à distância de um salto
inalcansável
«(...) Sem olhar à profundidade dos seus sentimentos,
à vastidão dos seus conhecimentos, o homem aparentemente completo não o é sem
que tenha aperfeiçoado as suas tendências. Quem quiser melhorar os
condicionalismos externos tem de começar por melhorar os internos. Quando as
coisas não estão a correr bem há qualquer coisa em mim a dizer-mo. Às vezes
tenho de pensar muito para descobrir o erro e como corrigi-lo. Depois de
resolver o problema sinto-me novamente bem. Isto prova que «O seu instinto
leva-o mais longe que o seu intelecto».
Alfred Montapert, in "A Suprema Filosofia do Homem"
___________
Intuir é negar à razão o direito a
conhecer de imediato; seja, é conhecer directamente as coisas sem a necessidade
de recorrer à razão para delas tomar conhecimento. E é por esse motivo que a
razão nega também a intuição pela sua incapacidade de a encontrar. O intelecto
não encontrando a intuição não a pode explicar, embora a possa sentir. E não a
pode explicar porque, para explicá-la seria necessário buscar a sua causalidade
- responder às perguntas: de onde ela vem, porque vem, como vem e qual a relação
causa-efeito entre a intuição e a coisa conhecida.
Ora, porque a intuição não nasce do
intelecto nem com o intelecto, não faz uso do recurso do raciocínio para
explicar sobre o conhecimento das coisas, não precisa da razão para conhecer,
porque ela é, em si mesma, um fenómeno não científico e irracional, um fenómeno
não-fenómeno, podemos com firmeza dizer que a intuição não se explica. Se
nascesse do intelecto ela poderia ser explicada, tinha que ser explicada porque
ela seria, obrigatoriamente, racional pela razão que vinha do e com o
raciocínio. Mas ela, a intuição, é um fenómeno irracional que jamais pode ser
reduzido ao intelecto.
E aqui cabe reflectir sobre os dois
domínios de existência - o (já) "conhecido" e o (por enquanto)
"desconhecido" (sendo que este último é aquilo que o intelecto ainda
busca) -, para podermos fazer uma destrinça entre aquilo que muito nos confunde:
entre o FENÓMENO (não-fenómeno) INTUIÇÃO e o PODER DO INTELECTO. Ou seja, entre aquilo que é inacessível ao conhecimento
e aquilo que a razão já conheceu ou
vai conhecer; entre o "impossível de conhecer" e o já "conhecido" que indagou o "onde",
o "como" e o "porquê", ou o que, embora (ainda) "desconhecido",
se vai conhecer usando o raciocínio. Portanto, um e outro fenómenos (estes dois
últimos) são domínios da razão para deles conhecer.
Assim, a intuição não é um fenómeno
"desconhecido", porque este,
sendo do domínio do intelecto, há de ser conhecido através da indagação, da
pesquisa, da experimentação. A intuição é, sim, um fenómeno "incognoscível"
- ou seja, inacessível ao conhecimento. A qualidade intrínseca do incognoscível
é ser isso mesmo: INCOGNOSCÍVEL. É com o incognoscível, isto é, com aquilo que
não pode ser conhecido pelo raciocínio, que a intuição labora, ao contrário da
razão que trabalha com o conhecido e com aquilo que, embora sendo desconhecido
pode vir a ser conhecido.
A intuição leva-nos mais longe que
o intelecto - «conhece-te a ti mesmo», disse o filósofo. A intuição é a arma perfeita para, em auto-análise seguida da acção, tornar o
Homem em «escola da sabedoria».
download da imagem: net
Jamais o intelecto poderá conhecer
o que nunca pode ser por ele conhecido. Esse místico incognoscível chamado
intuição vem de qualquer lugar desconhecido no vazio do ser, de qualquer lacuna
do ser, que nunca do intelecto - embora o intelecto a possa sentir mas nunca
explicá-la dado não ser um fenómeno científico mas, outrossim, um fenómeno puramente
irracional.
A intuição não acontece; surge de
qualquer lugar desconhecido do ser pois, se acontecesse, tinha necessariamente
que ser explicada. Podia ser explicada. Mas, porque a intuição vem de um
domínio diferente do acontecer, um domínio diferente de qualquer causa
intelectual e racional que forçosamente interroga e procura as causas primeiras
e últimas e as suas consequências com a finalidade de, aproximando-as do
intelecto, as explicar e chegar à primeira causa que moveu o primeiro motor
imóvel, ela é a realidade mais elevada do ser que, assim sendo-o, jamais
pode ser penetrada pela causa mais baixa, neste caso o intelecto do próprio
ser, que interroga para chegar à causa primeira. A intuição é essa causa
primeira e irracional do ser, é esse fenómeno não científico e inexplicável
pela razão por ser o poder mais elevado do ser.
É o fenómeno incognoscível que a
razão não alcança, tão semelhante à mente que penetra no corpo impossibilitando,
contudo, o seu contrário; assim a intuição pode penetrar no intelecto (poder
mais baixo) e nunca este pode ascender à intuição porque esta é o poder mais
elevado do ser.
Recorrendo ao raciocínio de Osho sobre
o que diz ser a intuição «(...) nem sequer é um fenómeno; é unicamente um pulo
no nada para o ser», se pode deduzir que a intuição é uma «lacuna» que apenas o
intelecto sente mas que é impotente para a explicar; embora sentindo-a como
lacuna, não a pode explicar porque não sabe, o intelecto, como nasce a
intuição, onde nasce a intuição e porque nasce a intuição.
Ela é um fenómeno que, na voz de
Osho, não chega a ser fenómeno. Àquilo a que a razão chega é apenas
"sentir" que "aconteceu qualquer coisa" que a ultrapassou.
E essa qualquer coisa é o tal fenómeno inexplicável, o tal fenómeno não
científico e irracional, o tal não-fenómeno.
A razão nega, sempre, poder à
intuição porque esta jamais pode ser explicada e o intelecto só aceita aquilo
que pode ser explicado. Tudo o que está para além da razão e a ultrapassa é a
realidade mais elevada do ser, o tal fenómeno que, não sendo fenómeno, não pode
ser explicado numa relação de causa-efeito, e jamais aceita, o intelecto, que a
intuição lhe fale. Ele, o intelecto, na sua procura das coisas, das causas e
dos seus efeitos, jamais deixa que o instinto lhe dê pareceres. Mas, mesmo
assim, ou talvez por isso mesmo, o intelecto estará sempre acorrentado à
intuição; jamais a razão se separará da intuição como o corpo jamais se
separará da mente.
A intuição, fenómeno não-fenómeno
mais elevado do ser, como lacuna do pensamento, jamais pode ser reduzida ao
intelecto.
E assim se justifica o título dado
ao inquietante artigo: A INTUIÇÃO E O INTELECTO - dois opostos entre dois
pontos, apenas à distância de um salto inalcançável.
_____________
© Alvaro Giesta
Já colocou um "gosto" nesta página? Obrigado.
Sem comentários:
Enviar um comentário