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(...) Um dos "papéis" da arte poética é expressar sentimentos humanos
e transmitir, de forma subjectiva, aspectos da nossa realidade – medos,
angústias, anseios, desgraça, pobreza... tudo quanto seja marginal e que, a
maioria dos nossos poetas de hoje fogem a retratar.
O
novo, o desconhecido, é algo que nos assusta enquanto seres humanos em quem o
receio está presente, em quem a expectativa é uma constante aliada ao medo da
dor e da dor na morte que ela nos possa causar. E como vamos nós pensar nesse
desconhecido que começa onde a vida acaba e a morte começa?
No
fazer poético de alguns poetas, a Morte não é o fim de um ciclo. Ela é
transmutação. É apenas o trânsito, a passagem breve para outra vida, passagem
ainda que fatal, pela fatalidade que o fenómeno Morte encerra, um ponto de
passagem, obrigatório para todos os seres vivos. É apenas a passagem para outra
vida, com princípio no próprio fim. Ela é, não deixando apenas de ser o fim,
também o princípio que começa onde esse fim termina.
Enquanto
poeta Alvaro Giesta, a liberdade da palavra, no uso poético que lhe é dada,
permite-lhe, em O Retorno ao Princípio,
filosofar acerca da morte. A morte, que é a garantia da ordem no mundo dos
homens, que é o que concede o diálogo, pois, no mundo humano adquire-se a vida
através da morte. Só, assim, a vida tem sentido.
O
filósofo Maurice Blanchot dizia que "a morte é a base de todo o alicerce
humano diferentemente do que ocorre no mundo literário". No texto poético
as palavras adquirem uma maior liberdade pela soma inesgotável de temas que se
nos propõem à imaginação trabalhando a matéria desses temas com a arte poética
que eles merecem. Daí que, considere, que não há morte em literatura. A
impossibilidade da morte diz respeito ao não-fim. Ou seja, a finalidade da
morte que nos surge diariamente na linguagem normal das evidências, não existe
na linguagem poética. Mesmo quando poetas como Fernando Echevarría nos dizem
que a morte é o fim e que, para além da morte nada mais há senão o fim; o nada;
o vácuo.
Mas
é exactamente esse fim poético que vai dar origem a novos olhares na poética de
Alvaro Giesta, no tema Vida-Morte, à tal "espuma" de Echevarría que lhe foi princípio. Porque, no seu
entendimento, é no nada e do nada que nasce a linguagem poética; é aí, no
preciso lugar "onde a luz e a obscuridade coincidem e se
transformam", que se dá o acto inaugural da palavra. À semelhança, e
contrariando Echevarría que na sua linguagem mais filosófica que meta-poética
diz que para além da morte nada mais há senão o nada, a morte, em Giesta, é o retorno
ao princípio a partir do nada onde se dá o acto inaugural da vida.
A
linguagem poética, neste caso na enfatização da morte pela palavra, não procura
uma finalidade, uma explicação, não procura atingir algo, atingir um fim -
isto, é para as religiões e seitas. Na linguagem poética a palavra não morre. A
palavra, se morre, é para dar vida à palavra nova porque "a palavra é a vida dessa morte",
como nos diz o filósofo Maurice Blanchot e o poeta Alvaro Giesta, num dos
poemas iniciais de O Retorno ao Princípio.
(...)"
do posfácio à obra por
Fernando. AlmeidaReis, ortónimo
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